Anônimo
nasceu numa tarde nublada de Junho. Depois de muitas horas de trabalho de
parto, Anônimo veio ao mundo, mas, ao contrário dos bebês normais, ele não
chorou. Hoje se sabe que Anônimo não era um bebê normal. Nunca foi. Não
importava se era dia ou noite, se estava quente ou frio, se tinha fome ou
outras dessas coisas de bebês, ele nunca chorava. A mãe dele, Sra. Alguém, as
vezes ia ao seu quarto de madrugada, e encontrava-o acordado, olhando fixo para
o teto, como se estivesse dormindo de olhos abertos.
Ele
também demorou mais para aprender a falar do que as outras crianças. Sua
primeira palavra foi “não”. Mesmo depois de começar a falar, ele não se
comunicava muito. Não falava nada além do necessário. Anônimo cresceu
solitário, sem amigos. Ele simplesmente não entendia as outras crianças. Por
que elas corriam e gritavam tanto? Por que arreganhavam a boca e mostravam os
dentes para mostrar que estavam felizes? Nada fazia sentido para Anônimo.
Ele,
quando pequeno, gostava de desenhar árvores e relógios. Cresceu, e trocou os
lápis de cor por bonecos dos Power Rangers. Com o tempo, também abandonou os
brinquedos, substituindo-os por livros. Anônimo gostava de ler. Ele sentia como
se estivesse vivendo uma vida que não era a sua. Uma vida de pessoas que sentem
e choram. Mas ele não gostava dos finais dos livros, pois as vidas que ele
vivia deixavam de existir, obrigando-o a voltar para a realidade, onde ele nada
sentia. Anônimo achava que a morte devia ser parecida com o final de um livro.
Anônimo
sabia que não era normal, e seus pais também. Mandaram-no para diversos
psicólogos e psiquiatras, mas nada mudou. Terapias, hipnose, medicamentos; nada
fazia efeito. Ele não sentia absolutamente nada, como se fosse um objeto inanimado,
como se não existisse. Nem os gritos que a mãe dava quando apanhava do Sr.
Alguém o emocionavam. Ele trancava-se no quarto e tentava chorar, ficar triste,
qualquer coisa, mas não conseguia. Uma vez ou outra ele sentia que era uma
pessoa ruim por não se importar com os outros. Não era culpa; estava mais para
uma nota de rodapé sobre sua própria vida. Assim que os gritos acabavam, esses
pensamentos iam embora, e ele voltava para os livros.
Um
dia Anônimo encontrou um cachorro morto na rua. Ele observou-o rapidamente,
reparando nas marcas de pneu no corpo do animal, depois virou as costas e foi
para casa. Não foi muito diferente quando ele recebeu a notícia da morte do
pai. Observou-o rapidamente estirado no caixão, com os algodões enfiados no
nariz, depois virou as costas e foi para casa. Não é preciso dizer que ele não
derramou uma lágrima, não é? A Sra. Alguém tentou se matar, tomando todos os
remédios que encontrou pela casa. Não conseguiu. Uma vizinha encontrou-a
desmaiada e socorreu-a. Anônimo visitou a mãe algumas vezes no hospital, mas
não prestou atenção nas palavras dela. Tudo o que ele queria era sair daquele
lugar e trancar-se em seu quarto.
Um
dia, já de madrugada, ele terminou de ler mais um de seus livros. As Aventuras
de Pinóquio. Ao contrário das outras vezes, não foi tomado pela sensação de
vazio que sucedia os finais dos livros. Alguma coisa naquela história havia
despertado algo novo dentro dele. Algo humano. Naquela noite, ele sonhou com a
fada azul, e chorou enquanto dormia. No outro dia, ele não se lembrava mais do
sonho, e as lágrimas em seu rosto já haviam secado. Anônimo se lembrou do
cachorro atropelado que encontrou outro dia, e sentiu-se triste. Ele sentiu algo pela primeira vez na vida, como um
menino de verdade.
5 comentários:
Que lindo esse texto! Acho que o Anônimo não era tão sem sentimentos assim, já que viajava através dos livros, talvez ele apenas ainda não tivesse se descoberto.
petalasdeliberdade.blogspot.com
Ah, esqueci de dizer que seu blog está lindo, o layout e a escolha das cores.
Pedro Lourenço arrasando como sempre!
www.cchamun.blogspot.com.br
Histórias, estórias e outras polêmicas
Realmente...seu blog esta linda.. Perfeitamente feito... E esse texto... Humm..Quando olhei...vi um monte de palavras...eu preguiça...Foi só levantar..conversar um pouco e voltar... Li, com uma sede...em apenas um gole.. #PERFEITO
http://escritordebrinquedo.blogspot.com.br/
Gostei muito das tuas histórias. Descreve bem os ambientes. Dá riqueza ao cenário.
Parabéns!
Meu blog é novo. É de contos eróticos.
Visite sem compromisso.
www.contoseroticosnr.blogspot.com.br
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